remedios_nov_2016fonte: BBC Brasil

Não é à toa que a Organização Mundial da Saúde (OMS) descreveu a resistência aos antibióticos como uma das maiores ameaças globais do século 21.

Mas o que está sendo feito para tentar evitar o que poderia ser chamado de “apocalipse dos antibióticos”?

Primeiramente, há uma tentativa de reduzir o uso deste tipo de medicamento, uma vez que, quanto mais antibiótico tomamos, mais resistentes as bactérias ficam.

O psicólogo Jason Doctor, da Universidade do Sul da Califórnia, vem desenvolvendo experimentos para verificar se é possível fazer com que os médicos receitem menos medicamentos.

Ele convenceu mais de 200 médicos a assinar uma carta dirigida a seus pacientes, assumindo o compromisso de serem mais rigorosos na hora de prescrever antibióticos. As cartas foram transformadas em cartazes e coladas nas paredes de seus consultórios.

Os experimentos também adotaram um sistema de classificação. Os médicos recebiam um e-mail mensal com informações sobre quantos antibióticos estavam prescrevendo inadequadamente em comparação aos seus colegas.

Foram criados ainda alertas nos computadores dos médicos, levando-os a questionar se realmente precisavam prescrever os antibióticos, e mostrando como poderiam lidar com pacientes insistentes que exigiam a medicação.

Quando todas essas abordagens diferentes foram adotadas juntas, o número de prescrições de antibióticos foi reduzido drasticamente.

Algumas dessas mudanças estão sendo implementadas nos Estados Unidos e em outros países. Mas, mesmo que as pessoas façam uso de antibióticos apenas quando estão precisando de fato, isso não resolveria o problema. Os seres humanos são um grande mercado para antibióticos, mas há um ainda maior.

Em 1950, foi descoberto que os antibióticos fazem os animais crescerem mais rápido. Desde então, fazendeiros de todo o mundo têm injetado o medicamento em seus animais, mesmo após estudos científicos comprovarem que a resistência bacteriana poderia passar dos animais para os seres humanos.

Um país, no entanto, mostrou que é possível reverter esse cenário.

A Holanda tem mais animais por metro quadrado do que qualquer outro país do planeta e, durante anos, esses animais foram rotineiramente alimentados com antibióticos. A proibição de dar antibióticos como promotores do crescimento aos animais surtia pouco efeito, uma vez que os agricultores usavam a mesma quantidade e apenas os rotulavam de forma diferente.

Mas, após uma série de danos à saúde, o governo decidiu repreender os fazendeiros. Em 2009, os agricultores foram avisados que teriam que reduzir em 20% a quantidade de antibióticos que davam aos seus animais, num período de dois anos, e em 50%, num prazo de cinco anos.

O veterinário Dik Mevius, especialista em doenças infecciosas, ajudou os agricultores a elaborar um plano para atingir essas metas.

Eles criaram um banco de dados, revelando os agricultores que mais transgrediam a regra, e impediram os fazendeiros de comprarem antibióticos de diferentes veterinários. Se um veterinário ou agricultor prescrevesse ou usasse antibiótico desnecessariamente, era multado ou perdia a licença.

Então, os fazendeiros holandeses entraram no eixo e pararam de usar tantos antibióticos. Para muitos deles, isso significou mudar a maneira como criavam seus animais.

“Foi realmente uma revolução”, disse Mevius. “Nós reduzimos em 60% a quantidade de antibióticos usados em apenas alguns anos”, completou.

A maioria dos países está, no entanto, caminhando na direção oposta. Estima-se que China, Brasil, Rússia, Índia e África do Sul deverão dobrar seu uso de antibióticos até 2030, o que levará a resistência a se espalhar. É por isso que cientistas de todo o mundo estão vasculhando oceanos, florestas tropicais e desertos em busca de novas fontes de antibióticos.

Recentemente, pesquisadores foram ao Panamá e colheram amostras da pele de uma preguiça de três dedos. Outros cientistas têm procurado novos antibióticos na saliva de dragões de Komodo. Mas ainda é muito cedo para dizer se esses experimentos serão bem sucedidos.

Comunicação entre bactérias

Há também aqueles que não estão procurando novos antibióticos, mas estão lutando contra as bactérias. A microbiologista Kim Hardie, da Universidade de Nottingham, na Inglaterra, estuda a forma como as bactérias se comunicam. Sim, as bactérias se comunicam.

Quando uma única bactéria chega aos seus pulmões, ela se esconde do seu sistema imunológico e dos anticorpos que podem matá-la. Ela não revela suas armas – suas toxinas -, mas fica ali, esperando.

“Uma vez que a bactéria percebe que é um bom lugar para se multiplicar, então ela se comunica”, explica a cientista.

As bactérias isoladas se relacionam umas com as outras, até sentirem que estão em número suficiente. Em seguida, se armam e atacam o sistema imunológico.

“Se você tem um único soldado contra um castelo, não vai ameaçar o castelo”, afirma Hardie.

“Mas, se esperar que o resto do exército chegue e mostre suas armas ao mesmo tempo, os soldados podem vencer o castelo.”

E se você puder impedir que as bactérias se comuniquem, fazendo com que, embora você tenha bactérias nocivas em seus pulmões, elas não consigam se relacionar umas com as outras e assim lançar um ataque?

Hardie afirma que isso pode ser feito e conta alguns experimentos em laboratório tiveram bons resultados. A pesquisadora estima que um antibiótico baseado neste princípio poderia chegar ao mercado em cerca de dez anos.

Há muitos outros experimentos e projetos em andamento. O sucesso vai depender, em grande parte, de aprendermos mais sobre as bactérias.

Como ensina o livro A Arte da Guerra, de Sun Tzu, é preciso conhecer o inimigo para vencer a batalha. Como podemos evitar o apocalipse de antibióticos? Aprendendo a enganar as bactérias.